quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Quando tudo vai bem...

Pollock

O coração bate tranqüilo,
As palavras faltam à boca – voam
De tão expostos, os sentimentos viram sentidos
E - da chuva costumeira aos pés-d`água do verão - nada importa
Ela acaba ficando bonita.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

O casal - ou - Os desconhecidos

Eles não se cruzam nas ruas
Os bailes que freqüentam são distantes
As conversas sem encaixe -

- um pergunta, o outro também, enquanto um responde o que o outro não perguntou.

Cada um tem sua música – e isso não dividem!
‘Cinema é lugar de ir sozinha’
Os livros? Nem se fale... um lê o outro finge

Mas nas fotos há eles
Lado a lado
Fui sempre casal e não sabia?

Nas impressões dias de sol
Era ele? É, era ele.
Sem tirar nem pôr

O casal se cruzava justo ali
Na solidão, nos feriados, nas férias, nos carnavais.
Aos domingos, nos dias pobres, quando não querem nada mais.

Quando não sobra tempo para nada
Mas é preciso fazer algo
Quando a companhia alheia já não basta
E é preciso não se sentir só
Quando o sol clareia o mar
E é preciso se ter amor.

É casal
Sem falas, nem complicações
É eterno
Se alimentam de paixões
É casal
Das aparentes distâncias - das vastas saudades
É eterno
Matam cada uma aos beijos, suores e olhares

Ô casal desconhecido.
Ô casal casado.
Ô casal amigo.
Ô casal namorado.
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quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Como tudo começou

Decidi passar a limpo meus cadernos poéticos da infância. Neles escrevia de tudo: poesias, músicas, era uma espécie de diário - sem data fixa - das coisas que me interessavam.
Nas lembranças achei muitas coisas bobas, mas algumas que me fizeram rir – e muito.
Segue abaixo uma passagem (duas na verdade) de como o meu escritor favorito se tornou O favorito.
A leitura vale a pena!

Hoje vou ler igual gente grande! (escrito dia 5 de julho de 1998)
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Meu velho irmão não para de estudar. Não que ele seja velho, mas de todos é o que nasceu primeiro. Agora ele comprou um livro que seu professor disse ser bom. Chama "Ensaio Sobre a Cegueira", peguei emprestado para ver qual é a história. Se eu gostar escrevo mais.


* É claro que muitos detalhes da leitura com certeza passaram à época. A pureza dos meus onze anos não compreendeu muito do que viria a ser meu livro de cabeceira. Mas, definitivamente, aquela leitura me instigou.


07/09/98
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Aquele livro (Ensaio Sobre a Cegueira) tem alguma coisa muito boa sim! E tão difícil... Mas já li! Minhas partes favoritas são:
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"A gente, disse no tom de quem sorri de si próprio, habitua-se tanto a ter olhos, que ainda julga que os pode usar quando já não lhe servem de nada"
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"Ora, é dos livros, mas muito mais da experiência vivida, que quem madruga por gosto ou quem por necessidade teve de madrugar, tolera mal que outros, na sua presença, continuem a dormir à perna solta, e com dobrada razão no caso de que estamos falando, porque há. uma grande diferença entre um cego que esteja a dormir e um cego a quem não serviu de nada ter aberto os olhos".
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"O ponteiro de sintonização continuava a extrair ruídos da pequena caixa, depois fixou-se, era uma canção, uma canção sem importância, mas os cegos foram-se aproximando, devagar, não se empurraram, paravam logo que sentiam uma presença a sua frente e ali se deixavam ficar, a ouvir, com os olhos muito abertos na direcção da voz que cantava, alguns choravam, como provavelmente só os cegos podem chorar, as lágrimas correndo simplesmente como de uma fonte".
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Descobri também que pode escrever palavrão nos livros! Tem uma parte que ele escreve merda! Achei bem engraçado.


Dezembro de 1998:

Estou muito feliz, hoje começo a ler "Memorial do Convento", do mesmo escritor do livro que eu gostei muito.


Bom... o resto não preciso escrever, não é?

Aconselho, intimo e desejo que você leia não apenas os dois primeiros que fizeram parte da minha vida, mas a obra inteira desse escritor magnífico, que tocou até a alma pueril de um serzinho aos onze anos de idade...

José Saramago

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Agora estamos de bem

Fiz as passes com Deus.
Que mulher divina!
Agora Ela entra em casa todos os dias.
A porta deixei aberta, as janelas também.
Entreguei-me à Ela de mente e coração – a alma não garanto, pois esta ainda não descobri onde fica.
Por que continuaria de mal?
É Ela quem me guia pela chuva, é Ela quem – apesar de nos dar as tempestades – nunca esquece de nos prover o carnaval.
Deus é linda. É puro sexto sentido.
E como fui tola de só entender hoje.
Deus é mulher dos pés a cabeça.
Sensível, boa e vingativa.
Com Deus fiz as passes.
De Deus fiquei amiga.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

E foi assim

Quadro: Romero Brito

Primeiro a direita e a esquerda
Depois o correr
Por entre esse meio falar
Por entre esse meio viver

E foi assim
O tempo passou
Aprendeu a ouvir
O que ponderou

Primeiro a música
Depois o balé
Por fim as letras
Para dar no pé

E foi assim
Cresceu curuminha
Arte após arte
Transformou a menininha.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Pessoas Instigantes

Elas são notáveis. É gente como a gente, mas são muito mais gente.
São pessoas que te atraem, pelo olhar e pela inteligência – sem querer - aparente.

- Ah me conte, quem é você?
- Como quem sou eu, Rachel? Eu sou eu, você já conhece.
- Não. Não pode ser, você é mais que isso, muito mais!

Cresci – e assim como você – admirei alguém. Talvez fosse o mistério da casa – que eu invadia todas as tardes ensaiando teatros e pianando. Talvez fosse o mistério dos quartos. Um escuro, com guarda-roupa abarrotado de fantasias, sapatos, com baús e penduricalhos. Outro já simples. Clean e multicultural, cheio de CDs e um berimbau.

Era tudo inspirador.

A amizade surgiu primeiro com ela. Mais velha do que meus nove anos, cuidava de mim. Me levou aos passeios de ônibus. Eu era sua assistente de bicos, cheia de orgulho puro! Ah, ela era minha amiga. Isso eu repetia sempre, fazia questão – ora para meu interior ora para meus amigos, que estavam longe de conhecer alguém assim... Ela saía com a máquina fotográfica, registrava as coisas, o mundo, as pessoas. Era belíssimo ela achava tudo lindo. A luz, o ar, o parque, o pirulito. Assim eu comecei a ver tudo lindo também! Inspirei-me nessa moça, que foi de gótica, hippie, zen, espiritual à perua atual. Country não me lembro, mas é provável que também tenha experimentado ser. Inspirei-me em seus cadernos sem linhas, nos seus desenhos, no seu inglês, no seu ar importante. Inspirei-me na sua oratória instigante. Era capaz de explicar qualquer coisa, até o que não sabia! Bela, maquiada, (já relatei neste espaço o quanto admiro as pessoas maquiadas, se não lembra leia aqui!) de salto, unhas feitas, colorida, era mulher. Inspirei-me nela profundamente e talvez por isso eu tenha virado isso.
Sonhava em sonhos mil. Cantar, atuar, tocar. Mas ela não fazia nada disso, ela lia. E eu li. As inspirações foram outras, a música é outra, mas cresci buscando enchê-la de orgulho sempre e, para que ao olhar para mim e ouvir:

- Eu procurei ser você e me achei, assim: brasileira apaixonada!

Sentisse e pensasse:

- É cria minha!


O outro quarto? Ah, lá tinha um moço. Belo e de cachos! Não sai com ele para nada aos meus nove anos – e nem agora aos 21. Nunca precisou haver um diálogo se quer, eu sabia que ele era inteligentíssimo! Não o conheço profundamente, nem superficialmente, mas eu sei que um dia vou ser apta a conversar com ele. O moço me inspirou por sua intelectualidade moderna, não era chato, bitolado, nerd. Era belo, estiloso e mentalmente capaz de qualquer coisa. Claro que tudo o que digo hoje são as minhas impressões infantis, que formei aos nove anos e as mantive até hoje – coisa que não me arrependo. Sabe aquela pessoa que você vê em um metrô abarrotado de longe e pensa: ''Poxa, será um dia terei um amigo assim? Gostaria de conversar com ele". É, o moço de cachos é assim. Um dia eu sei que chego lá. Vou poder – talvez nos meus 70 anos – conversar com ele, nem que seja sobre a cor do céu em dia chuvoso.



** Inspirei-me é claro, ao brincar de novo com ela! Dessa vez de ser menina, pintar e cortar!

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Enlace

Era dia. Com a luz nada escondiam, nada podiam. Eram dois, belos, famintos. Eram dois escancarados, nas olheiras, nos olhares, nos gestos e nas fugas. Saíram à rua após um sonho mal sonhado. Se remexiam, acordavam, tiravam as roupas, as colocavam. Marcados pelo desespero, um medo de que qualquer tocar fosse pôr fim nessa loucura, cansativa e prazerosa. Ah! Como seria esse fim... se é que chegariam lá - era tudo o que sonhavam. Saíram à rua famintos. Cada um por um lado, cada um por uma porta.

O primeiro olhar complacente seria, sem dúvida, para ele.
O primeiro olhar complacente seria, sem dúvida, para ela.

As cartas foram dadas. Agora o destino lhes armava – lhes mandava. Iriam se esbarrar?

Quê é isso... deixe para lá.

Não trombaram. Ao primeiro cruzar se engoliram. Ele nela, ela nele. Acharam - entre os enlaces – o outro insaciável. A busca teve fim. Entenderam que queriam só isso: ele nela, ela nele.
Foi fácil dormir.


* Escrito dia 05/08/2003, era dia.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Fim


Escrevo, escrevo e nada sai. Talvez seja falta de amor; mas com certeza e a necessidade de dor. Cheguei ao fim, ao hiato da inspiração. As palavras me fugiram correndo, desesperadas. O que iria fazer? Fiquei com dó e as deixei livres. Sonho doce esse de escrever, mas já era hora de acordar: quem escreve sente, quem não sente consente em não saber escrevinhar.